A PERSONALIDADE DE SÃO
JOSÉ
A devoção a São José nem sempre foi
honrosa para ele. Muitas vezes se lhe atribuiu uma personalidade cansada,
descolorida.
Quantas vezes foi apresentado como um
velho! Um homem cheio de bondade e santidade que não podia deixar de inspirar
simpatia, mas a quem se tirava o privilégio da juventude. A idade que se lhe
dava parecia tão desproporcionada com a missão que devia desempenhar em Nazaré!
Ao vê-lo tão carregado de anos, com uma barba que atestava o seu número, podia
ser tomado como avô de Jesus e com relação a Maria teria idade mais de pai do
que de esposo.
Não se reparava que apresentando-o
assim não se honrava nem a Virgem nem o Menino. Pretendia-se constituí-lo mais
um guardião ou um protetor de Maria do que um companheiro de vida, como se
temesse que a sua juventude fosse um perigo para a pureza virginal de sua
esposa. Era tirar a beleza e harmonia àquela missão, negando o amor que devia
ser a origem dessa missão. Era também não querer dar um verdadeiro pai a Jesus,
como se o filho não pudesse crescer e desenvolver-se senão em contato com a
sabedoria dum velho.
Felizmente, produziu-se, em época
recente, uma reação tendente a representar José sob um aspecto cada vez mais
jovem. Embora o Evangelho não nos diga nada sobre a sua idade, devemos admitir
que quando uniu a sua vida à de Maria deveria ter a idade em que os jovens
geralmente se casam. Uniu a sua juventude à de Maria. Devemos, pois,
representar José com os traços de um homem jovem. De resto ele não conheceu a
velhice visto ter morrido antes de Jesus começar a sua vida pública.
José possuía sobretudo a juventude da
alma: tem a personalidade de um jovem. É de fato, privilégio da juventude
querer transformar o mundo com as novidades. Os jovens consideram o mundo como
um campo onde desejam exercitar o seu ardor e desenvolver as suas
possibilidades de ação, que lhes parecem ilimitadas, para o transformar e
aperfeiçoar. Sonham criar de novo o mundo para o tornar melhor. E não fazem mal
ter tal sonho, porque, pouco a pouco, graças a esta ação constante de uma
juventude que se renovará, a humanidade continuará a sua ascensão.
Foi com esta mentalidade, própria de
um jovem, que José encarou o mundo como lhe podia aparecer na sua aldeia de
Nazaré. Tinha certamente consciência de que o ofício que exercia não lhe
permitia influenciar, de modo palpável, a evolução da humanidade. Desejava,
porém, com toda a alma, contribuir para a formação de um mundo melhor. No povo
judaico esta ambição de jovem era mantida pela ardente esperança messiânica. De
há muito os jovens esperavam impacientemente um Messias, um Salvador. Até
então, esta esperança ainda não tinha sido satisfeita. Mas em cada geração não
tomava ela novo impulso no coração dos jovens? José não cessou de aspirar a
este regime ideal que havia de ser instaurado pelo Messias.
Ele acreditar, pois, na vinda de um
mundo novo. E embora soubesse que a hora desta vinda dependia da vontade
divina, estava decidido a contribuir com sua modesta parte para a preparação do
reino messiânico. Contribuiria, de modo especial, para isso trabalhando por ser
perfeitamente o que devia ser no posto assinalado pela Providência.
Com ardente confiança da sua
juventude, esperava apressar, com uma vida que agradasse ao Senhor, a formação
de um povo novo, mais santo.
José não devia só à juventude das
suas forças físicas e do seu temperamento esta atitude de fervor. Vinha-lhe
sobretudo da própria juventude de Deus, porque é Deus o Ser perenemente jovem
que comunica ao homem a verdadeira juventude, sempre permanente e renovada.
José abrira a sua alma à ação íntima do Senhor, pondo-se inteiramente à
disposição da vontade divina. Por isso estava cheio daquela alegria com que
Deus manifesta a sua presença. Deus comunicava à sua alma uma juventude mais
real do que a do seu corpo. Infundia-lhe uma nova visão do mundo e
entusiasmava-o pelo futuro melhor que ia preparando, o futuro preanunciado
pelos profetas.
Tal devia ser o estado de alma de
José quando encontrou Maria. Daí em diante, nunca perdeu esta juventude. De
resto, os acontecimentos que estavam para influir na sua vida pessoal não lhe
demonstrariam que tinha razão de esperar e de esperar por um mundo novo iminente?
E não lhe indicariam que ele, José, por pequeno que fosse na imensidade do
universo, poderia contribuir eficazmente para a preparação desta renovação? A
sua ardente juventude sentiu-se animada. Se não conseguimos imaginar Maria sob
os traços da velhice, pois parece-nos que permaneceu sempre jovem, o mesmo
devemos pensar de José: a sua juventude, inspirada pela juventude divina, nunca
desapareceu.
A vara florida ou a açucena (flor)
postas na mão de José em muitos dos seus quadros ou estátuas não são menos
características do que a sua barba de velho venerando. São um símbolo evidente:
a vara florida recorda, segundo a lenda propagada pelos apócrifos, a escolha
Divina que o designara para esposo da Virgem, o único entre muitos; açucena
lembra a castidade admirável deste esposo virginal. Mas o gesto de segurar uma
flor tão pouco condizente com um homem contribui para o constituir um ser
convencional, ofuscando assim o vigor da sua personalidade. Com as suas mãos
calejadas de trabalhador, José manejou outras que não eram flores.
A alma de José era certamente toda
delicadeza. A sua juventude foi uma primavera não isenta de poesia. Teve uma
vida saudável e o seu casamento demonstra-o claramente. Foi com grande frescura
de sentimentos que se aproximou de Maria. Se foi escolhido por Deus para ser
seu esposo, compreendemos que devia ser dotado de fina sensibilidade, capaz de
compreender a fineza de ânimo de Maria, de apreciar o seu perfume e de
concordar com ela.
Contudo, a sua personalidade não era
semelhante a uma planta de ornato. Não tinha nada de artificial ou retórico.
Não naufragava no sentimentalismo fácil. José foi um homem que conservou sempre
o temperamento viril e teve uma alma particularmente forte. Precisou desta
força para desempenhar a missão de chefe de família. A sua castidade foi a
expressão desta força, a autêntica força espiritual que assegura o domínio da
alma sobre o corpo sabendo impor-se uma disciplina de vida.
Pela força do seu caráter foi o
amparo de Maria, como o deve ser o esposo para com a esposa. Com ela exerceu a
sua autoridade de Pai e de educador sobre o Menino Jesus.
José possuía esta força notavelmente
equilibrada. O que o Evangelho nos diz dele dá-nos a impressão de um homem que
procede com grande sabedoria e tranquila segurança. Vivendo para o Senhor e
servindo-o não tinha porventura consciência de receber dele a força necessária,
sobretudo nas ocasiões mais difíceis? Isto preservava-o de ser impulsivo e
inconsiderado, levando-o a proceder com calma e perseverante energia.
José devia aparecer jovem e forte,
rico de uma personalidade cumulada de dons naturais e mais ainda de graça
divina.
____
Para citar: GALOT, Jean. São
José. Coleção Gena Sancta.
Tradução de Manuel Alves da Silva, S.J. Edições Paulistas: 1965. (Alexandria
Católica) Publicado no blog Regozija-te
com a verdade aos 29 de maio de 2017.
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